Durante as internações hospitalares para realizar o tratamento do câncer, quando o paciente é uma criança/adolescente, devemos lembrar que além de cuidar do enfermo, deve-se ter uma atenção importante aos familiares. Danos causados pela doença também são capazes de afetar os pais de modo intenso, pois pode haver uma mudança na rotina doméstica, no aspecto financeiro e profissional dos cuidadores, tendo potencial até de afetar a vida conjugal dos pares, o que algumas vezes causa certa desestruturação na família. Em geral, as famílias se envolvem com tudo o que acontece, do momento do diagnóstico até as intercorrências do tratamento, tudo gira ao redor do doente, de seu estado físico e psíquico. Assim, há angústia quando o paciente passa mal, sustos caso algo diferente aconteça e superproteção no cotidiano familiar.
É importante ter um cuidado especial com os acompanhantes que passam por um momento de crise, dada a ocorrência de um desequilíbrio entre a quantidade de ajustamento necessário de uma única vez e os recursos psíquicos imediatamente disponíveis para lidar com ele. O desequilíbrio na dinâmica familiar é muito comum em situações em que o paciente mora em um município diferente daquele que realiza o tratamento e tem internações recorrentes, pois diante da necessidade da criança/adolescente ter uma atenção integral de pelo menos um familiar, na maioria das vezes, a mãe, essa acompanhante se ausenta do trabalho, das atividades domésticas, dos grupos sociais que frequentava e até mesmo fica distante do marido e dos outros filhos.
Em alguns casos, que são acompanhados pela Casa Durval Paiva, após o diagnóstico de câncer de um dos filhos, a família passa por uma nova configuração familiar. Geralmente, o pai fica responsável pela manutenção financeira da família, aumentando a cobrança pessoal, pois, se antes a família tinha a renda do pai e da mãe, agora ele será o único responsável pela aquisição dos recursos. Os outros filhos precisam ter uma pessoa de referência que assuma os cuidados. Comumente são as avós ou tias que ocupam esse lugar, enquanto a mãe está acompanhando o filho doente. E, por vezes, surgem conflitos conjugais, principalmente pelo casal estar passando por um momento de fragilidade emocional e ter dificuldade de solucioná-los.
Por vezes, o familiar que acompanha o paciente (geralmente, a mãe) quer poupar aquele outro que está distante (comumente, o pai), por imaginar que vai minimizar o sofrimento do outro se ele não tiver acesso às informações. Nessas situações, pode vir à tona sentimentos de culpa por omitir ou por imaginar que tais notícias causarão sofrimento. O familiar que não vivencia a rotina do tratamento tem o direito violado de ter acesso às informações clínicas do paciente, dificultando que ele entre em contato com o sistema de crenças – com a sua visão diante da doença e da vida – possibilitando mudanças nos estigmas relacionados ao câncer.
É importante que o psico-oncologista trabalhe o fortalecimento dos vínculos afetivos entre família e paciente, tendo como objetivo facilitar o diálogo verdadeiro, capacitando-os a compartilhar experiências e emoções, como também a participação dos familiares nas decisões junto ao paciente. É pensar que através de relações e vínculos saudáveis, eles podem ter mais facilidade para seguir juntos, formando uma grande parceria. No momento em que se atende o filho, eles podem compartilhar as dores, medos e angústias para que estas possam ser amenizadas.
As perdas, fantasias e medos são aspectos que podem ser trabalhados pela equipe multidisciplinar através da clarificação e comunicação. A sociedade silencia a dor da alma porque é ameaçadora. O psico-oncologista deve trabalhar com as crenças individuais que cada um delas apresenta. Para compreender como uma pessoa lida com o adoecimento de alguém muito querido é necessário entender como ela interpreta a doença.
POR: Laíse Santos Cabral de Oliveira – Psicóloga – CRP 17-3166
Referências:
Franco, Maria Helena Pereira. (2008) Trabalho com pessoas enlutadas. In: Carvalho et al. Temas em psico-oncologia. (2008) São Paulo, Summus.
Silva, Rafaella Brito e, & Boaventura, Carolina Brum Faria. (2011). Psico-oncologia e Gestalt-terapia: uma comunicação possível e necessária. Revista da Abordagem Gestáltica, 17(1), 37-46.
Venâncio, Juliana Lima. (2004). Importância da Atuação do Psicólogo no Tratamento de Mulheres com Câncer de Mama. Revista Brasileira de Cancerologia 2004; 50(1): 55-63