Abrindo o e-mail da Sociedade Americana de Oncologia Clínica, com a aprovação pela US Food and Drug Administration do dinutuximab, a médica Susan L. Cohn lembrou de sua paciente Amy (os nomes foram alterados). Chicago, EUA, Amy com três anos de idade, em 2007, e com diagnóstico de um neuroblastoma de alto risco, uma doença metastática em múltiplos ossos. Para as crianças com alguns tipos de câncer, é possível enfatizar o prognóstico excelente, mas nesse caso de neuroblastoma de alto risco, aproximadamente 40% das crianças podem ser curadas.
Ela foi inicialmente tratada com a terapia mieloablativa seguida de transplante de medula óssea e quimioterapia2. Amy tolerou bem a quimioterapia de indução, mas teve febres altas e lesões graves nas mucosas, permanecendo no hospital por semanas após o transplante. Depois Amy recebeu radiação e sete meses após o seu diagnostico, estava em remissão.
A médica Susan L. Cohn ficou emocionada com a excelente resposta ao tratamento, mas sabia do risco da doença residual. Os pais também foram informados do risco significativo de recaída, mas um ensaio clínico aberto era possível para Amy. Um estudo clínico prévio, de grupo randomizado, tinha mostrado que a isotretinoína oral (ácido cis-retinóico [RA]) administrada após a consolidação melhorava o resultado para pacientes com neuroblastoma de alto risco. Com base nesses resultados, o RA era agora parte da terapia padrão para o neuroblastoma de alto risco. “No entanto, estamos sempre à procura de melhores tratamentos e sua filha é elegível para um novo ensaio clínico randomizado, comparando RA sozinho com imunoterapia combinada com RA”, explicou a médica.
Os pais de Amy ficaram preocupados com o fato de Amy necessitar novamente estar internada e ficar separada da sua irmã. A mãe e o pai de Amy, após uma semana, manifestaram sua decisão: “Nós decidimos participar do ensaio clínico. Minha filha se beneficiou de famílias que matricularam seus filhos em estudos clínicos prévios e queremos ajudar crianças no futuro com esta doença”. Amy foi então inscrita no estudo e designado para o braço de imunoterapia. Ela desenvolveu muitas das toxicidades esperadas da imunoterapia, e sua mãe se perguntou por diversas vezes se tinha tomado a decisão certa. Mas Amy completou a terapia planejada e oito anos mais tarde, permanece em remissão. Hoje é uma pré-adolescente saudável que adora a escola.
A médica, em março de 2015, ligou para a mãe de Amy com a notícia sobre a aprovação da Food and Drug Administration dos EUA. A liberação do dinutuximab se baseava na demonstração de uma sobrevida significativamente melhor com imunoterapia associada ao RA no ensaio clínico randomizado do Children’s Oncology Group.3 Seu ato altruísta (da mãe de Amy) ajudaria crianças com neuroblastoma no futuro.
O ensaio clínico ou o estudo clínico é uma pesquisa científica que pretende responder uma pergunta sobre determinada intervenção que pode ser com um medicamento, um produto para a saúde ou uma vacina que deve ser controlada a fim de avaliarmos a segurança e a eficácia desta intervenção. São indicados para avaliar a segurança e eficácia de um novo produto, uma nova formulação de um mesmo produto ou associação de produtos já́ em uso e uma nova indicação Clínica de um produto já́ aprovado. Os ensaios podem avaliar o efeito terapêutico (drogas) ou profilático (vacinas). Toda substância para uso médico deve ter uma indicação especifica, em função de seu efeito biológico desejado para o qual se elabora um ensaio clinico.
O desenho do protocolo e documentação Clínica dos estudos devem seguir as recomendações dos órgãos normativos e de vigilância de medicamentos do país, para que os resultados possam ser considerados válidos para aprovação do produto. Um novo produto só́ é levado à experimentação em seres humanos depois de conhecido seus aspectos químicos, farmacológicos, mecanismos de ação e toxicidade em provas pré-Clínica, in vitro ou em modelos experimentais quando disponíveis. Os ensaios clínicos permitem determinação de incidências e do risco relativo; consideração simultânea de vários desfechos clínicos. Mas principalmente, podem ajudar no tratamento futuro de outros pacientes, como no caso de Amy da médica de Chicago.
1. texto adaprtado de Cohn SL.:Selfless Act., J Clin Oncol. 2015 Nov 10;33(32):3834-5. doi: 10.1200/JCO.2015.62.5137.
2. Matthay KK, Villablanca JG, Seeger RC, et al: Treatment of high-risk neuroblastoma with intensive chemotherapy, radiotherapy, autologous bone marrow transplantation, and 13-cis-retinoic acid. N Engl J Med 341:1165-1173, 1999
Yu AL, Gilman AL, Ozkaynak MF, et al: Anti-GD2 antibody with GM-CSF, interleukin-2, and isotretinoin for neuroblastoma. N Engl J Med 363:1324-1334, 2010
Escrito por Annick Beaugrand – Médica Oncologista Pediatra – Professora Dep. Pediatria UFRN