Adelaide Alaís Alves
Psicóloga – Casa Durval Paiva
CRP 17/4085
“[…]amor e perda são duas faces da mesma moeda. Não podemos ter um sem nos arriscar ao outro” – Colin Murray Parkes
Mãe leoa, que protege a cria, que coloca embaixo do braço e luta contra tudo e todos. Era assim que muitos a viam. Filho amado, daqueles que todos veem e sentem o cuidado, que de longe chega a brilhar de tanto amor que mãe leoa dá.
Quando a doença foi anunciada, já dava para ver, era uma necessidade de reaprender. Mas até nisso era feroz, não queria demonstrar e escolhia bem os lugares para desmoronar, chorava com contenção, mas os olhos entregavam a aflição.
As horas de sono diminuíram, porque quando a cria se mexia automaticamente a insônia já batia. Sobre um amor não dá para discutir, seja ele qual for, de irmão, de primo, de tia ou avó, mas de uma mãe, muitos arriscam dizer, que ainda está para nascer quem muito mais amou.
Amor de mãe sente até na dor, quando vê o filho ser furado, sendo mexido e remexido, sente a dor da perda dos cabelos, por ela bem cultivados curtos, longos ou cacheados, ela lembra de cada detalhe como os penteou, mas continua feroz e nos olhos está dizendo: “eu tenho que aguentar por nós”.
Firme vai seguindo, cuidando de cada detalhe, horário de medicamentos, internações, remédios e alimentação, mas o que mais chama atenção é a maestria no cuidado dos detalhes que ninguém vê, é o frio no pé, o tempero certo do feijão, o que faz quando sente dor, pois os olhos daquela mãe leoa são os olhos do amor.
O tempo vai passando e a mãe valente começa a parecer menos contente, percebe o filho mais doente. Os dois como um laço selam um contrato, o contrato do amor que não importa seja a dor que for, nada vai separar, vão enfrentar juntos, até essa dor passar.
O sono cada vez mais longe deixa a mãe leoa como quem vigia um predador, mas o olhar de fúria e alerta dá espaço mais uma vez ao amor. Quando olha o “leãozinho” dormir, a mãe leoa desmorona, é a hora da prece e da fé, do choro silencioso, que chega a ser ensurdecedor, porque começa a perceber que se tem limites para o poder do amor.
Feito mãe leoa que sente, que entra na frente para proteger a cria, parece até que os dois já sabiam o que estava por vir, a mãe leoa escondia, mas bem lá fundo ela sabia, que seu leãozinho iria partir. Custava acreditar nesse destino reverso, que muda todo o verso dessa vida sem controle, onde de repente tudo fica ao contrário, o amor dá espaço para a dor e como faces da mesmo moeda, quanto mais se ama mais se dói, como quem arranca um pedaço, a vida dá um nó naquele laço.
O mundo da mãe leoa virou, o leãozinho a deixou. Ela até hoje não sabe explicar o tamanho dor que as vezes vem visitar. Mas uma coisa que não se foi e nem se vai é o amor da mãe, que mesmo sem chão se doou. Doação que chega a ser divina, que só mãe dá, que não tem espaço nenhum que possa ocupar. Hoje a mãe leoa se reinventa, cuida dos outros, dá carinho, amor e proteção, mas entendeu que esse momento vai precisar de atenção. Aprendeu que não teria como conseguir sozinha enfrentar a dor que parece não ter fim e procura uma mão com os olhos dizendo “eu preciso cuidar de mim”.
Quem muito ofereceu cuidado, não deixou de oferecer, a Casa Durval Paiva continua a acolher, não só a mãe leoa, mas até o irmão que mostrou muita precisão naquele momento de dor, o luto vem sendo observado e a ele tem sido dado outros significados.
Eles têm dito que a psicoterapia do luto ajudou, que têm começado a entender que existe um preço no amor, esse preço é a saudade eterna daquele que se ausentou.