O adoecimento, principalmente para crianças e adolescentes, além de sintomas físicos, traz repercussões emocionais que podem ser vivenciadas como situações traumáticas na vida do sujeito. Para dar conta de uma nova rotina, cheia de consultas, procedimentos e restrições, o sujeito “deixa de ser criança”. Durante o tratamento oncológico, por exemplo, pacientes e familiares frequentam o hospital e a casa de apoio – instituições que carregam a marca de cuidado, porém, também tem a marca de adoecimento e de dor. As condições do tratamento quebram sua rotina de vida, podendo alcançar sua totalidade de modo que o desenvolvimento físico, emocional, social e cognitivo podem ser afetados. Assim, surgem demandas psicológicas que requerem bastante atenção.
Na Casa Durval Paiva, uma das atividades pensadas para garantir o resgate da rotina do ser criança, é o Passeio Terapia, o qual ocorre quinzenalmente e tem como principal objetivo promover o acesso à cultura e ao lazer, numa articulação e interação com sua realidade de vida e os temas propostos na classe domiciliar. O Passeio Terapia tem o intuito de despertar um novo conhecimento de mundo e um momento fora da rotina de tratamento das crianças e adolescentes atendidos na instituição. É o ir além das paredes da casa e do ambiente hospitalar em que eles realizam o tratamento.
Os passeios oportunizam o resgate da cidadania, possibilitando o acesso à cultura e a circulação humanizada pela cidade. Além disso, também tem como foco reinseri-los na sociedade com dignidade. Há relatos de pacientes que, através dessa atividade, teve a oportunidade de ver o mar e sentir a areia da praia pela primeira vez. Também houve a partilha de que ir ao campo de futebol foi a realização de um sonho. É imprescindível ultrapassar a própria estrutura física e buscar uma rede de suporte social. Essa atividade mostra o quão importante é pensar em uma rotina voltada para os usuários, incentivando a cultura e priorizando as necessidades e desejos da vida cotidiana do grupo.
Estimular a independência e a autonomia não significa deixá-los tomar decisões e fazer escolhas por conta própria. Para um desenvolvimento saudável é necessário que se interaja com o ambiente, seja ele interno – como foi pontuado, a casa de apoio e o hospital, ou externo. Incentivar a realização de atividades e propor novos desafios é fundamental para dar a possibilidade deles superarem seus limites e explorarem o ambiente. É importante observar como essas crianças/adolescentes enfrentam os erros, as decepções e o olhar do outro. A partir do contato com a sociedade, é possível identificar possíveis dificuldades de enfrentamento durante e após o tratamento médico, como por exemplo, o olhar preconceituoso ou de pena da sociedade diante de pacientes carecas e com máscaras no rosto.
A observação do psicólogo em ambientes externo à estrutura física da instituição permite futuras intervenções durante os atendimentos individuais e grupais, possibilitando o fortalecimento das estratégias de enfrentamento utilizadas por cada um dos pacientes, para vivenciar o processo de tratamento do modo mais saudável possível. Percebe-se ainda o fortalecimento do vínculo com a equipe de cuidado, o aumento da autoestima e, por consequência, uma melhor adesão terapêutica.
Laíse Santos Cabral de Oliveira
Psicóloga – Casa Durval Paiva
CRP 17-3166